terça-feira, 25 de novembro de 2014

Ela tem mil facas e parece não cansar de me acertar

Como um trem que insiste em passar pela velha e abandonada estação de uma cidadezinha perdida no meio do nada, em horários absurdos, as vezes as 10 da manhã duma quinta-feira de sol, ou as 5 da tarde num sábado angustiante, outras vezes as 15 pra meia noite da segunda-ferira monótona e de total apatia, assim sem aviso, sem ser esperada, ela resolve aparecer.

Por mais que eu tente me enganar, as coisas não vão lá muito bem, é uma luta diária pra tentar colocar tudo em ordem. Sentimentos sendo domados e empurrados à força pra dentro de grades feitas de medo, que nada mais é senão o mais resistente dos materiais capaz de aprisionar sentimentos tão fortes. Pensamentos anestesiados por doses cavalares de angústia e ansiedade, corpo, coração, mente e alma resignados ao seu destino.

Então ela aparece.

O trem chega com todo seu barulho, fumaça e confusão.

Sei que não é por mal. Eu sei. Não há maldade, não há intenção de machucar, mesmo quando se tem certeza que vai causar dor, confusão e sofrimento.

Também sei que é inevitável.

Pra ela e pra mim.

Ela precisa se sentir perto de alguma forma, manter contato, ainda não está pronta pra seguir em frente, pra aceitar que cometeu o maior erro da sua vida e tentar consertar tudo ou deixar partir.

Eu, bem, eu não sei de nada mais nessa vida, ao menos não no meio dessa confusão toda.

Nesse momento ela é um trem desgovernado que vaga à milhares de km por hora sem rumo, cruzando à todo vapor por trilhos perigosos, passando por vales desolados, cordilheiras abismais, desertos áridos e cidadezinhas abandonadas perdidas no meio do nada, cenários vazios que não alimentam sua alma e nem matam sua sede de sentido e que ao menor descuido podem causar um desastre de proporções terríveis. Em seu movimento furioso, ela é um enorme perigo, pra si mesma, pra quem cruzar seu caminho, pra mim também, sendo ou não sua parada final, sua última estação, seu ponto de chegada.

Entre as tantas vezes que esse trem passa feito relâmpago pela velha e abandonada estação encrustada no fundo da minha alma, eu me sinto num picadeiro de circo, amarrado ao alvo que gira, enquanto ela lança suas facas afiadas tentando a sorte de cortar as cordas que nos prendem um ao outro, ou ao que ela julga estar mantendo nossos corações tão longe.

Ela abre os olhos e joga as facas.

Eu fecho os olhos e sinto minha carne ser cortada.

Ela tem mil facas e parece não cansar de me acertar.



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