terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Noite dessas eu te vi

Noite dessas eu te vi.

Tenho que admitir que estive te procurando em todos os cantos. Olhos sempre atentos pra ver se você cruzava meu caminho. Na próxima esquina, no ágile prata que parou ao lado no sinal, no corredor das massas no mercado, na grama do parque ou no lago da universidade. Meus olhos e meu coração estavam sempre a escanear os ambientes à procura de você.

Te procurei por toda parte sim. Mas não com o objetivo de me aproximar, dizer olá e perguntar como anda a vida sem mim? Te procurei por toda parte como o garotinho magrela da 3° série foge do brutamontes do 6° ano que prometeu com sangue nos olhos: _te pego na saída nanico!!!_ Tenho olhado atentamente pra todos os lados quando coloco os pés pra fora de casa, como o coelho que sai da toca em busca de alimento e sabe que a espreita, em algum canto lá fora está o lobo, faminto e raivoso a lhe caçar.

É estranho procurar e não querer encontrar.

Quando se procura algo com o intuito de ser bem sucedido, se você acha, se realiza. Se não encontra, se frustra. Ou seja, é simples, é a ordem natural das coisas. Procurar e não querer achar é diferente, é pior. Porque não há solução que contente. Ao procurar e não desejar encontrar alguém, fica sempre a sensação que o pior está por vir. Se não encontrou hoje, amanhã pode ser o dia, ou depois, ou a próxima esquina, o outro ágile, no corredor dos chocolates...

E então a catástrofe premeditada acontece.

..ao dobrar a esquina cantarolando aquela música brega que você ouve todo dia na rádio  _"Sabe aquela menina sentada ali? Com um olhar desconfiado, tão inocente Eu já fui doente naquela mulher"_ ela está ali parada colocando moedas no parquímetro. O passo é interrompido subitamente de tal forma que a senhora que vem caminhando atrás de você não tem tempo de desviar e esbarra na sua mochila, esbraveja algo e segue andando. Pronto. Essa quebra da rotina desordenada na calçada movimentada do centro foi suficiente pra chamar atenção de todos ao redor, inclusive de quem estava pegando o ticket do parquímetro. Os olhares se cruzam. Os corações congelam. E acontece exatamente o que estava escrito no roteiro. Como o covarde magrela da 3° série a única opção é dar meia volta e fugir o mais rápido possível com a esperança de não estar sendo seguido por seu algoz...

...o carrinho do "super" já tem todos os ingredientes pra janta do sábado. Massa carbonara. Uma deliciosa bomba calórica. Só falta o principal. A massa tem que ser aquela que ela adorava e fez você se apaixonar também, da caixinha. Qual era o número mesmo? 13? não não, 13 foi a sua a amiga que cozinhou outro dia com molho branco e champignons. Ela amava a número 3. Ao levantar os olhos da lista de compras, parada bem ali no meio do corredor, com uma maldita caixinha de massa número 3 nas mãos, está ela. Olhos grudados em você. Petrificada. Eu sempre achei curioso encontrar no mercado, abandonado em algum canto, um carrinho cheio de compras. Sempre me perguntei o que faria uma pessoa abandonar suas compras no meio do processo e ir embora? Talvez se deu conta de que deixou a carteira em casa, pouca grana no bolso, uma dor de barriga súbita ou as visitas que viriam pro jantar ligaram cancelando? Se alguém naquele final de tarde, naquele corredor das massas daquele super se deparou com um carrinho cheio de ingredientes para preparar uma bela massa carbonara, se questionou o que aconteceu com o "dono das compras" eu não sei, mas duvido que a pessoa tenha acertado o motivo do abandono. Quem haveria de pensar que um coração apavorado seja capaz de esquecer a fome, a vergonha e a dignidade e sair correndo de um lugar como se escapasse de um prédio em chamas?...

...o auto-falante 12" pifado já há uns bons 10 meses não tem ajudado em nada na "santa missão" de ajudar a diminuir o nível de estresse no trânsito infernal dessa cidade. Morar no centro tem seus prós e contras, mas certamente o pior "contra" é o maldito trânsito. Pink Floyd - Coming back to life rolando no som, que sai dum lado só. Sinal fechado. Calor. Ar condicionado desligado pra evitar irritar ainda mais a garganta, vidros escancarados. Nível de estresse subindo gradativamente a cada metro andado e a cada 10 minutos parados. Tudo bem, tudo bem, o pensamento começa a voar longe, imaginando lugares paradisíacos, praias, cachoeiras, piscinas, loiras e morenas de biquíni, chope...e quando os olhos voltam a focar o mundo real, estou olhando fixamente pela janela do caroneiro. O carro ao lado é um dos centenas de milhares ágile prata que parecem brotar em todas as ruas dessa cidade. Mas no retrovisor desse ágile em especial havia pendurado um "adorno" muito singular. Atrás do volante, olhando diretamente pro clio vermelho, estava ela. Graças ao auto-falante que não funciona, pude ouvir a música que vinha do carro vizinho. Pearl Jam - Yellow ledbetter. O sinal abre. As buzinas enlouquecem a berrar clamando por movimento. Por longos e intermináveis segundos dois carros param de vez o trafego que já era lento. Tudo está parado. O Mundo todo e toda a gente está parada observando aquela cena absurda. Um Mashup de Pink Floyd com Pearl Jam faz a trilha sonora de um acidente automobilístico. O clio vermelho vai passar algumas semanas na funilaria pra remendar os estragos causados pelo carro-forte amarelo que vinha no sentido contrário da mão única que era a rota de fuga acessível no momento...

Não. Não foi de nenhuma dessas formas que eu te vi.

Eu te vi mesmo foi noite dessas ai.

Foi no meu barzinho favorito, tradicional noite de sexta de rock com os amigos. Fer Costa, Rodrigo Campanholo e Black Birds tocando all night long. Nunca me passou pela cabeça encontrar você ali. Bem ali onde você nunca aceitou convite meu pra ir, porque era lugar que seu ex frequentava e você não queria correr o risco de cruzar com ele. Mas comigo você assumiu o risco. E assim como a lei de trânsito diz que se você assumir o risco de causar um acidente você é culpado, a lei da vida também condena quem displicentemente coloca em risco a sanidade de outro. Se tivesse me passado pela cabeça que poderia te encontrar logo no meu lugar preferido, onde todos os meus amigos amam passar agradáveis e despreocupados momentos, eu teria deixado uma foto sua com o porteiro. Pediria pra ele me ligar caso você aparecesse e então eu iria pra um extremo da cidade, ou do mundo se possível. E se você estivesse acompanhada eu apareceria armado. Mas seria como na velha canção do Rosa Tattooada..._sorriu e disse adeus, o inferno vai ter que esperar_...

Noite dessas eu te vi. Vestido vermelho, amigos na mesa, e você bebia uma caneca de chope.

Noite dessas eu te vi. Você nunca usou vestido vermelho. Você nunca bebeu uma caneca de chope.

Noite dessas eu te vi. Eu sei que não era você. A garota tinha apenas uma mera semelhança contigo, alguma coisa lembrava o cabelo ou o olhar. Mas eu sei que não era você.

Noite dessas eu te vi. Não era você mas eu prefiro acreditar e dizer pra mim mesmo que era sim.

Noite dessas eu te vi. Então não preciso mais te procurar por aí, porque o maldito destino já cumpriu a sua promessa. Já vi você. Já sobrevivi. Não preciso mais te procurar. Agradeceria se você também parasse de me procurar em todas as esquinas, em todos os carros ao lado e em todos os corredores de mercado.

Noite dessas eu te vi. Espero que você também tenha me visto em alguma das suas noites de delírio.

Noite dessas eu te vi. Este foi meu ponto final na procura do que não queria encontrar.




terça-feira, 9 de dezembro de 2014

Estamos lentamente dançando em um quarto em chamas

Você pode ler esse texto ao som de https://www.youtube.com/watch?v=32GZ3suxRn4


Já perdi a fé na vida algumas vezes. Duvidei do presente e do futuro tantas vezes que não sei mais contá-las nos dedos das mãos. Já estive a beira do abismo, já convivi com a escuridão, brinquei com o perigo, me afoguei com fogo e me queimei com água algumas vezes também. Deixei de acreditar, duvidei da vida das coisas do coração e das coisas da alma de todas as maneiras  que são possíveis à um simples homem se questionar. Desisti muitas vezes de olhar nos olhos pois sabia que só veria refletido ali o vazio do meu próprio olhar. Senti vergonha muitas vezes. Vergonha do que fiz, do que me tornei e do que ainda haveria de ser.

Pra servir de contra-ponto sempre fui bom em recomeços. Lamber as feridas, sacudir a poeira e recomeçar a caminhar mesmo que mancando fazem parte do meu repertório de "habilidades adquiridas à contragosto ao longo do tempo". A palavra bonitinha que da nome a isso pode até ser RESILIÊNCIA, mas eu prefiro chamar de instinto de sobrevivência. A incrível, inegável, inconfundível e mais difícil coisa de se ignorar: a necessidade de seguir em frente e provar pra si mesmo que a capacidade de chegar "lá" ainda mora em você. Se tem algo que fica gritando e martelando na sua cabeça insistentemente por horas e horas à fio, dia após dia, é essa necessidade que impera sobre todas as demais coisas importantes ou não na sua vida. Esse precisar, esse querer, essa urgência em levantar do chão, sair do lugar mesmo sem rumo definido, sem plano traçado ou objetivo meramente claro. Levantar e caminhar nem que seja a passo de tartaruga. Tudo na sua vida clama por movimento depois da queda. E de tanto cair também aprende-se a levantar.

E olha que nessa hora, a hora sagrada de se afastar do solo, erguer a cabeça e acostumar a visão ao olho-no-olho novamente, a elegância e a graça nos gestos nos atos e no andar podem tornar as coisas mais suaves e agradáveis, mas sinceramente chega determinado ponto da existência humana em que essa preocupação fica em segundo plano e mesmo sendo a trancos e barrancos, com topadas feias nas quinas escondidas da vida, escorregando aqui e ali nas estradas mal pavimentadas do cotidiano ou se agarrando com unhas e dentes nos íngremes penhascos dos dias difíceis, o que conta mesmo não é o estado em que você vai chegar, se vai estar dignamente vestido prum baile de gala com seu smoking novinho e o sapato brilhando mais que uma supernova ou se a única coisa que cobrir sua nudez for os velhos trapos que resistiram as batalhas cruéis do Bom Combate, e sim o modo como você se manteve caminhando.

Os passos foram firmes ou trôpegos? Não importa. Importa apenas se o caráter foi mantido intacto. Foi um agradável passeio ou uma luta infindável por cada gota de ar respirado? Não importa. Importa mesmo é se sua alma está imaculada. Teve ajuda e boas companhias ou trilhou o caminho na mais completa e absoluta solidão? Não faz diferença se manteve teu coração puro e solicito. Se durante o caminho conseguiu colocar à prova e comprovar a tese de que "os fins não justificam os meios", se o caminho te desafiou a mostrar o melhor de ti, e destes o melhor, e mesmo assim conseguistes chegar, então pode te considerar um vencedor e sentir-se orgulhoso de fazer parte do seleto grupo dos que reconquistaram a fé na vida e no caminho a ser trilhado.

As coisas podem começar como terminaram, ou até mesmo terminar como começaram. Meu caminho tem muito ainda dos mesmos passos lentos da dança que consumiu noites frias de um longo e longínquo inverno passado. Porque eu sei que nós "ESTAMOS LENTAMENTE DANÇANDO EM UM QUARTO EM CHAMAS" e continuaremos assim por um bom tempo ainda, quem sabe até que o fogo tenha se apagado, ou até que o fogo tenha nos consumido totalmente.


quinta-feira, 4 de dezembro de 2014

Um dos 5 melhores...

Eu sempre sonhei em ser bom em alguma coisa, mas muito bom mesmo, tipo um dos 5 melhores do mundo.

Poderia ser no esporte. Futebol, vôlei, tênis, natação ou futebol americano, ping-pong, surf ou jogo do taco mesmo.

Podia ser também em algo intelectual. Um gênio da ciência, matemática avançada, astrofísico nuclear, especialista em qualquer tipo de teoria indecifrável pra todo o resto da humanidade ou quem sabe decorar todos os gibis da Turma da Mônica.

Talvez algo divertido. Melhor jogador de Super Mario do mundo, o cara imbatível no jogo do UNO ou Banco Imobiliário, bater o recorde de bolinhas de sabão por minuto ou o mais rápido em subir escadas com um pé só.

Algumas vezes tenho a ilusão de que eu realmente poderia ser muito bom em algo que nunca tentei. Fico imaginando um dia pegando uma bola de baseball e arremessando a 150 km por hora, ou sei lá quanto é rápido o bastante um lançamento nesse esporte, e descobrindo ali sem mais nem menos um talento nato, algo que nasceu em mim e sempre me acompanhou mas nunca descobri. E ao ser dono dessa nova habilidade eu seria um dos 5 melhores arremessadores de baseball do mundo.

Já pensei em abrir um livro que fala sobre a Teoria das Cordas, dos Buracos de Minhoca e tantas teorias malucas e perceber que além de estar entendendo tudo que está escrito ali eu ainda encontraria uma série de erros elementares e conseguiria resolver todos os "furos" dessas teorias. Seria então agraciado com um Nobel e levaria a humanidade à outros patamares da evolução do conhecimento.

Ou quem sabe acordar uma certa manhã com a mente e o espírito iluminados a tal ponto que conseguiria apenas com as palavras e ideias acabar com as mazelas e conflitos da humanidade. Colocaria fim na fome e nas doenças que assolam a Africa, poria fim nos milenares e sangrentos conflitos do Oriente Médio, sanaria a ganância e a falta de escrúpulos dos poderosos que condenam seus "iguais mas inferiores" à miséria e ao sofrimento do dia a dia.

Despertar pruma nova vida sendo e sentindo-se diferente. Sendo e sentindo-se especial e capaz de coisas especiais. Acordar num mundo em que pessoas sem grandes talentos e sem grandes ambições como eu possam fazer diferença pelo simples fato de fazer e pensar e sentir diferente. Abrir os olhos e encontrar ali bem ao alcance dum abraço uma legião de pessoas que também tem os mesmos sonhos e os mesmos desejos. Porque eu sei que se não me sentisse tão sozinho nessa tarefa de sonhar um futuro bom pra toda a gente seria mais fácil colocar em prática meu plano de salvar o mundo com pequenas doses diárias de amor e sorrisos. Quando encontrar outros corações dispostos a encarar essa árdua missão que consome os dias, missão de sorrir e amar e cuidar e querer bem e não julgar...etc etc etc...aí então acho que meu desejo de ser um dos 5 melhores vai desaparecer, porque seremos todos melhores em tudo e não mais fará sentido querer se destacar entre tantos corações e mentes cheias de amor.

Sei que existem tais corações dispostos mundo afora, sinto que muitas vezes me aproximo de alguns deles, estou aprendendo a reconhece-los, talvez pelo olhar, pelo sorriso ou pela sincronia em que batem nossos corações. Por enquanto os tenho chamado de "amigos". Mas quando as coisas começarem a evoluir de verdade os chamarei de "irmãos".




terça-feira, 2 de dezembro de 2014

Estremecer



Quanto tempo faz? Mais de uma década?
Ainda dói como se tivesse sido a quatro minutos atrás
Nós só influenciamos um ao outro totalmente
Nós só machucamos um ao outro ainda mais, então

O que você é, meu sangue? Você me toca como se fosse meu sangue
O que você é, minha mãe? Você me afeta como se fosse minha mãe
Por quanto tempo um garoto pode estar algemado a você?
Quanto tempo até que minha dignidade seja devolvida?
Quanto tempo um garoto pode permanecer assombrado por você?
Logo eu crescerei e não vou sequer estremecer ao ouvir seu nome
Logo eu crescerei e não vou sequer estremecer ao ouvir seu nome

Aonde você esteve? Eu ouvi dizer que você se mudou pra minha cidade
Meu irmão viu você em algum lugar no centro da cidade
Eu ficaria paralisado se me encontrasse com você
Minha língua agarraria o céu da boca se nos encontrássemos
outra vez

O que você é, meu deus? Você me toca como se fosse meu deus
O que você é, meu gêmeo? Você me afeta como se fosse meu gêmeo

Por quanto tempo um garoto pode ser torturado por você?
Quanto tempo até que minha dignidade seja devolvida?
Quanto tempo um garoto pode permanecer assombrado por você?
Logo eu crescerei e não vou sequer estremecer ao ouvir seu nome
Logo eu crescerei e não vou sequer estremecer ao ouvir seu nome

Então aqui estou, no quarto ao lado de onde sei que você está
Um homem bem-intencionado me disse que você acabou de entrar
Esse homem não sabe como essa informação me afetou
Mas ele sabe a cor do carro no qual eu acabei de ir embora

O que você é, meu parente? Você me toca como se fosse meu parente
O que você é, meu ar? Você me afeta como se fosse meu ar



Será que você pode me odiar?




Odeio quando eu brigo contigo e tu não me responde. 

Odeio tua covardia de não revidar, não brigar de volta. 

Por que não me manda pro inferno? Por que não usa os piores palavões que passarem pela tua mente. 

O teu silêncio é pior do que qualquer agressão tua, teu silêncio me tortura.

 Então me manda pro inferno, ao menos vou saber que está braba comigo. 

Me deixa sentir tua fúria, me mostra tua ira, grita com a boca e com os olhos e com o corpo que me odeia.

 Maldição, se você me odiasse seria tão mais fácil seguir em frente. 

Já te pedi pra você me amar.

Você não pode me amar.

Será que você pode me odiar?